O Mexilhão Dourado nas águas da Tríplice Fronteira
Em 2004 a ONG Atelier Saladero (Barra do Quaraí) lançou diversos alertas às autoridades brasileria sobre a presença e o avanço do Mexilhão Dourado (Limnoperna fortunei) em nossos rios, especificamente, rio Uruguai e rio Quarai.
Esse alerta, entretanto, não econtrou eco. Praticamente nada foi feito pelos órgãos nacionais com o objetivo de conscientizar a comunidade ou conter a invasão biológica do molusco.
Ele tem apenas 4 centímetros, mas tem o potencial de parar uma cidade, causando a suspensão do fornecimento de energia elétrica ou de água. Na verdade, ele já é a causa de muito prejuízo, tanto econômico como ambiental
Conforme o estudo do Prof. Gustavo Darrigran, a dispersão do Mexilhão Dourado pela bacia do Prata se realiza "contra a corrente, a uma velocidade de 240 km/ano, afetandos os países membros do Mercosul". |
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O estudo do Prof. Darrigram pode ser solicitado à ONG Atelier Saladero através do formulário ao fim desta página. |
Um "tapete" de mexilhões na bacia do Rio Quaraí! - O pescador e militante da ONG Atelier Saladero, Jairo Daniel, mostra as pedras "coalhadas" de mexilhão dourado às margens do rio Quaraí. "Quando as águas descem, a gente anda por aqui pisando num verdadeiro tapete desses moluscos. É impressionante como surgiram... em pouco tempo tomaram conta de muito espaço", afirma.
O Mexilhão Dourado aparece cobrindo as pedras às margens do rio Quaraí. O pescador que desconhecia "a praga da globalização" hoje convive com ela. "A partir del año 1991 se regista en Argentina, y por primera vez en Amércia del Sur, a presencia de un mejillón de agua dulce. Esta especie, al igual que sus parientes marinos, vive fija a los sustratos duros. Limnoperna fortunei (mejillón dorado) ocupa un nicho vacante en los ambientes de agua dulce de América del Sur. Desde entonces, el impacta tanto el ambiente natural -- cambio de dieta en peces, despazamiento de especies nativas -- como humanos" (Gustavo Darrigran y Maria Cristina Damborenea).
"Na Ilha Brasileira, localizada na confluência dos rios Quaraí e Uruguai, é visível o volume “absurdo” de mexilhões dourados, entranhados nas raízes expostas das árvores. A infestação consome a flora e provoca danos aos motores de barcos. De acordo com Argemiro Rocha, Presidente da ONG Atelier Saladero, a situação de desequilíbrio evidente do meio ambiente não recebeu resposta de autoridades brasileiras. Ele explica que os barrenses buscaram na Universidade de La Plata, na Argentina, por meio do especialista Gustavo Darrigran, respostas aos fenômenos com a realização de análises que apontem a oxigenação das águas, adaptação e transformação dos moluscos, além do envio de amostras do próprio mexilhão. Darrigran foi quem identificou essa espécie vinda da Ásia em Buenos Aires" ( por Silvana Losekann).
Entrevista com Gustavo A. Darrigran
e Maria Cristina Damborenea
O alerta da ONG Atelier Saladero sobre a presença do Mexilhão Dourado nas águas da Tríplice Fronteira atraiu a atenção de muitos estudiosos. A entidade recebeu duas grandes autoridades no assunto: Dr. Gustavo A. Darrigran, da Universidad Nacional de La Plata, o primeiro estudioso a detectar a presença do Mexilhão Dourado na América do Sul e Maria Cristina Damborenea, Doutora em Ciências Naturais. Ambos escreveram a obra “Bio-invasión del Mejillón Dorado en el Continente Americano”, uma referência completa sobre o tema.
Darrigran relatou que “desde 2006 está pesquisando em Monte Caseros, Argentina, a presença do Mexilhão Dourado no rio Uruguai. Graças à informação que nos chegou por Luis Mujica (integrante do Movimento Transfronteiriço), ficamos sabendo da presença do Mexilhão Dourado aqui em Barra do Quaraí. Viemos, então, estudar o seu nível de expansão”.
ONG Atelier Saladero - Pelo que sabemos, o sr. foi quem detectou pela primeira vez exemplares do Limnoperna fortunei na América do Sul. Poderia contar como aconteceu?
Gustavo Darrigran - O Mexilhão foi detectado por nós nas margens do rio da Prata, em 1991, proveniente da Ásia. A povoação dos moluscos era inicial, com 4 ou 5 indivíduos por metro quadrado, grudados em rochas, num balneário da província de Buenos Aires. Esses exemplares, 4 ou 5 por metro quadrado, tinham o tamanho de 1 centímetro, revelando que há um ano já estavam na região. Portanto, ingressaram naquele ecossistema em 1990.
O notável é que, um ano depois, esses 4 ou 5 indivíduos, aumentaram a densidade e, no mesmo lugar, nas mesmas pedras, chegaram a 30 mil indivíduos por metro quadrado. Dois anos depois, esse número passou a 80 mil indivíduos por metro quadrado chegando até a um pico de 150 mil. Isto dá uma idéia da capacidade reprodutiva e adaptativa da espécie. E se a isto somarmos que está indo contra a corrente da bacia do Prata, a uma velocidade de 240 km por ano, faz desta espécie uma praga invasora perigosa. Um dos problemas: entupir os tubos e filtros usados para a retirada da água dos rios.
ONG Atelier Saladero - Há como controlar?
Gustavo Darrigran - Uma força tarefa para controlar um avanço tão rápido pela bacia do Prata deveria ser feita desde o início. Ou seja, em cada localidade onde pela primeira vez se encontra é preciso estabelecer uma força tarefa local e regional. Nós intentamos através da Universidade Nacional de La Plata com um programa de educação sobre o problema. No Brasil, o IBAMA e o Ministério do Meio Ambiente estão empenhados em formar uma força tarefa, uma agrupação de agentes comunitários, docentes e investigadores. Acredito que o Brasil está encabeçando essa reação no contexto dos países Uruguai, Argentina e Paraguai.
ONG Atelier Saladero - O que foi detectado, hoje, nas águas da Tríplice Fronteira?
Gustavo Darrigran - Estivemos com Jairo, pescador integrante da ONG, percorrendo vários pontos do rio Uruguai até o chegarmos no encontro com o rio Meriñae. Nesse local, jogamos um gancho e tiramos muitos exemplares de Mexilhão Dourado que se encontravam no fundo do rio, numa profundidade de 3 metros. Esse fundo era arenoso e as raízes das plantas estavam tomadas por grande quantidade de Mexilhão Dourado.
ONG Atelier Saladero - O que revela essa descoberta?
Gustavo Darrigran - Esperávamos encontrar uma povoação inicial de assentamento. Percebemos que é uma povoação muito densa e há muito tempo está aclimatizada no local e adaptada ao ambiente. Os pescadores nos disseram que pelo menos há dois anos se encontra neste ecossistema. Mas, pelo tamanho dos exemplares que coletamos posso dizer que há três anos estão se multiplicando por aqui.
ONG Atelier Saladero - O Sr. gostaria de acrescentar algo?
Gustavo Darrigran - Desejo acrescentar que, nesta região da Tríplice Fronteira, onde três países estão em jogo, é importante fazer investigações sempre tendendo a conseguir uma prevenção e um controle deste novo problema econômico e ambiental para a água doce da América do Sul, algo que era conhecido unicamente nas costas marinhas, não na água doce. Assim todos os sistemas que captam a água doce, na região, não estão preparados para suportar esse problema. Daí ser um problema econômico muito grave. Por outro lado, há uma destruição dos moluscos nativos por parte do Mexilhão Dourado ocasionando um impacto ambiental muito grande. Também porque serve de alimento extra para os peixes e alguns já mudaram de alimento por causa da grande quantidade de mexilhão nos rios.
Dra. Maria Cristina - Quero apenas agregar que estamos trabalhando há muitos anos com o Mexilhão Dourado e observando como avança pelos rios. Na Argentina, o ponto mais ao norte era Monte Caseros. Agora, essa povoação segue avançando. Esse avanço tem um componente muito importante: a atividade humana na região. É preciso prestar atenção na forma como se amplia a distribuição da espécie na região e encontrar uma forma de difundir o problema, a questão e fazer com que as pessoas conheçam essa nova espécie que está em nossas águas.
VÍDEO - Fevereiro de 2012 - Reportagem da RBS mostra o "tapete" de Mexilhão Dourado nas águas do Rio Quarai e o alerta da ONG Atelier Saladero sobre a ameaça que o molusco representa para as lavouras da região.
O Prof. Gustavo Darrigram observa uma ausência de "madurez intelectual y operativa" nas investigações sobre o impacto das invasões aquáticas.
A maioria destas investigações apenas descrevem os impactos ou são estudos sobre as consequências em diferentes espaços e tempos. O único que se faz é referir-se sobre o que já se sabe ou se assume. Ao analisar as Atas da Conferência Internacional sobre Espécies Invasoras Aquáticas, realizadas em Washington, em 2002, 62% dos trabalhos ali apresentados foram sobre impactos ou efeitos econômicos-ecológicos e aspectos referidos a controle e tratamento.
Quer dizer, se descreve o problema e logo se indica o que fazer nesses casos; isto é investigação reativa ou curativa. Entre nós, existe uma marcada deficiência nesse tipo de investigação...